Esqueci-me
- O Autor
- 19 de dez. de 2018
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Esqueci-me.
Esqueci-me que os dias passam, o tempo teima em avançar, sou cada vez mais cismática com o tempo, que queres? É que a vida foge de mim e este ano nem usei aquele meu vestido comprido que tanto gosto, a ver se aproveito ao menos o Inverno para tirar o pó àqueles casacos largos de lã com que tanto gostas de implicar. Tirá-los do armário, sair do armário. É tão bom, devias tentar qualquer dia. Deixar o sol entrar, o vento fustigar-te os sentidos, sentir a chuva e o cheiro da terra molhada. A vida é feita de clichés maravilhosos. Às vezes esqueço-me do bom que é viver, ver os dias passar, correr para os agarrar, senti-los escorregar-nos entre os dedos e, depois, sem avisar, viver. Viver é tão bom e eu esqueci-me.
Esqueci-me que o sentimento passa, o amor é fogo que arde sem se ver, já dizia o Camões, mas depois ficam as cinzas, se remexeres, a saudade; mas magoa tanto, é o problema da saudade. Magoa tanto. Depois vem a tristeza, a mágoa, o vazio. Pior do que sentir tudo é não sentir nada. É preciso querer viajar nesse carrossel de sentimentos e emoções sempre como se fosse a última volta. Sem medo, e quando o medo chegar sente tudo o mais que puderes com a pele com os olhos, com a visão, saboreia cada momento e alimenta esse teu pequeno coração. Sentir é tão bom e eu esqueci-me.
Esqueci-me que a vontade passa, querer ou não querer, bem-me-quer, mal-me-quer e quando deres conta nem todas as vontades da Blimunda e do Baltasar poderiam fazer-te levantar da cama e ter vontade. A vontade passa, abafada pelo êxito, pelo insucesso, pelo ser, pelo que não se é, pelo que fica, sem descanso. É preciso força de vontade, já me dizia a minha mãe e ai de ti que fiques um dia inteiro na cama sem abrir as janelas, é preciso o pão nosso de cada dia e aproveitar cada vontade, boa vontade, má vontade, com o à vontade de quem sabe o que quer. Ter vontade é tão bom.
Esqueci-me.
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